O Supremo Tribunal Federal (STF) e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) lançaram, nesta terça-feira, o Plano Pena Justa, um plano nacional voltado ao enfrentamento da situação de calamidade no sistema prisional brasileiro. A iniciativa, construída em parceria com o Ministério da Justiça e Segurança Pública, conta com a colaboração de instituições da sociedade civil – incluindo o IBCCRIM – e outros órgãos públicos atuantes no sistema de justiça criminal.
A criação do Pena Justa segue determinação do STF no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 347, realizado em outubro de 2023. Na ocasião, o Supremo reconheceu a existência de um estado de coisas inconstitucional no sistema prisional do país, caracterizado por graves violações de direitos fundamentais das pessoas privadas de liberdade.
Metas e diretrizes do Plano Pena Justa
O Pena Justa estabelece mais de 300 metas a serem cumpridas até 2027, incluindo prazos e indicadores de monitoramento. O plano servirá de base para a formulação de políticas estaduais específicas, que serão desenvolvidas por meio de comitês interinstitucionais formados por diversos órgãos e entidades.
De acordo com Mariana Py Muniz, coordenadora do Departamento de Sistema Prisional do IBCCRIM, um dos principais eixos do plano é o controle permanente da superlotação carcerária, problema crônico do sistema prisional brasileiro. “A população prisional do Brasil ultrapassa em muito a capacidade do sistema, gerando um déficit de vagas significativo. O controle dessa população é essencial para garantir condições mínimas de dignidade”, afirmou.
Além do enfrentamento da superlotação, o Pena Justa busca ampliar o acesso a oportunidades de trabalho e estudo para pessoas privadas de liberdade. Para isso, prevê articulações com a Justiça do Trabalho e programas educacionais que possam viabilizar melhores condições de reintegração social. Outro ponto de destaque é a garantia de condições de salubridade nas unidades prisionais.
O Brasil já foi alvo de sanções no Sistema Interamericano de Direitos Humanos (SIDH) devido às condições degradantes em estabelecimentos como o Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho, no Rio de Janeiro, e o Complexo do Curado, em Pernambuco. Em ambos os casos, foram reconhecidas violações severas, resultando na determinação de medidas como o cômputo em dobro da pena para pessoas detidas em tais condições.
Para Mariana Py Muniz, a precariedade das unidades prisionais compromete a assistência prevista na Lei de Execução Penal, impactando áreas como saúde, alimentação e contato com o mundo externo. “Essas condições indignas fortalecem facções criminosas, pois muitos grupos organizados surgiram dentro do próprio sistema prisional, explorando a vulnerabilidade da população carcerária e agravando os ciclos de violência”, explicou.
A coordenadora também ressalta a importância do papel do IBCCRIM no acompanhamento e monitoramento da implementação do plano, tanto em âmbito nacional quanto estadual. “Isso é algo pioneiro, será a primeira vez que uma decisão judicial, com base na teoria do Estado de Coisas Inconstitucional — que surgiu no Tribunal da Colômbia —, declara essa situação em relação ao sistema prisional brasileiro. Por ser um processo estrutural que demanda a ação conjunta de diversos poderes da República, o Instituto deve monitorar seu cumprimento, garantindo que possamos reduzir os danos já causados por essa superlotação e esse estado de coisas inconstitucional, que o próprio Supremo reconheceu”, acrescentou Mariana Py Muniz.
O IBCCRIM segue acompanhando a implementação do Pena Justa e reforça a importância da atuação da sociedade civil na construção e monitoramento de políticas públicas voltadas à garantia de direitos fundamentais no sistema prisional brasileiro.