O Departamento de Infância e Juventude do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM) divulgou nota técnica contrária ao Projeto de Lei nº 853/2024, que propõe alterações na Lei dos Crimes Hediondos (Lei nº 8.072/1990) e na Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210/1984). A proposta, em tramitação no Senado Federal, pretende incluir no rol de crimes hediondos os delitos de pornografia infantil, prostituição e exploração sexual de crianças e adolescentes, além de vedar a progressão de regime de pena para pessoas condenadas por esses crimes.
Segundo o Departamento do IBCCRIM, o texto viola o princípio da individualização da pena previsto no art. 5º, inciso XLVI, da Constituição Federal, que garante que a execução da pena deve ser analisada conforme as circunstâncias de cada caso. A nota cita precedentes do Supremo Tribunal Federal, como o HC 82.959/SP e a Súmula Vinculante nº 26, que reconhecem a importância da atuação judicial na individualização da pena também na fase de execução.
A mera inclusão de alguns crimes contra crianças e adolescentes (por mais graves que sejam) no rol de crimes hediondos revela-se apenas um artifício para mascarar a raiz do problema: a ausência de -regulamentação eficaz das redes sociais, da internet e das big techs, ambientes e meios virtuais que, baseada em uma defesa vazia de uma “liberdade de expressão” sem limites ou regulação jurídica consistente, tornam-se espaços bastante propícios ao desenvolvimento e ampliação deste tipo perverso de criminalidade.
O IBCCRIM aponta, ainda, que a proposta tem caráter meramente simbólico e não enfrenta as causas reais da violência contra crianças e adolescentes. O documento critica a recorrência de soluções legislativas punitivistas, que, embora aparentem endurecimento, não produzem resultados efetivos. A “Lei Henry Borel” (Lei nº 14.344/2022) é citada como exemplo de norma que, apesar de ampliar penas, não reduziu a incidência de crimes de violência infantil.
Para o Instituto, o foco deve estar na efetiva proteção da infância e na regulação das plataformas digitais, que se tornaram ambientes propícios à disseminação de conteúdos abusivos. O documento ressalta que crimes de exploração sexual infantil ocorrem em redes amplamente acessadas, como Instagram, Facebook e Discord, e que a ausência de fiscalização e controle estatal sobre esses espaços contribui para o agravamento da violência.
“O Projeto de Lei nº 853/2024 merece repúdio integral, pois acumula violações à Constituição sem apresentar soluções reais”, conclui a nota. O IBCCRIM reafirma seu compromisso com a proteção integral de crianças e adolescentes e defende políticas públicas concretas, articuladas e baseadas na regulamentação das interações digitais como o caminho mais efetivo para o enfrentamento da exploração sexual infantojuvenil.