(Foto: Heitor Hui/Agência Estado)
No dia 2 de outubro de 1992, a Tropa de Choque da Polícia Militar de São Paulo invadiu o Pavilhão 9 da Casa de Detenção, no complexo do Carandiru, e assassinou 111 pessoas presas sob custódia do Estado. O episódio, que completa hoje 33 anos, permanece como um marco da violência estatal e da falência estrutural do sistema prisional brasileiro.
“Foi justamente a crescente escalada de violência estatal, cujo cume foi a malfadada incursão policial que deixou 111 mortos no complexo prisional, que levou profissionais atuantes no campo das ciências criminais a formar o IBCCRIM: para promover os Direitos Humanos e oferecer um contraponto à violência e ao autoritarismo penal”, registra documento do Instituto encaminhado ao Supremo Tribunal Federal (STF), no âmbito da ADI 7330.
Mais de três décadas após o massacre, o cárcere segue sendo espaço onde se perpetram violações sistemáticas de direitos fundamentais. Superlotação, condições degradantes de salubridade, falta de assistência em saúde e alimentação, violações ao direito de defesa, além da restrição a direitos, como o fim da saída temporária e a exigência de exame criminológico para progressão de regime, continuam a marcar a realidade prisional brasileira.
A política criminal do país permanece centrada no encarceramento em massa, alimentada por legislações punitivistas e pela deturpação da função primordial das audiências de custódia. O resultado é um país com a terceira maior população prisional do mundo, alvo recorrente de sanções na Corte Interamericana de Direitos Humanos (como nos casos do Complexo do Curado, em Pernambuco, e do Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho, no Rio de Janeiro).
O Supremo Tribunal Federal, ao julgar a ADPF 347, reconheceu a existência de um estado de coisas inconstitucional no sistema prisional brasileiro, caracterizado pela violação generalizada e contínua de direitos fundamentais.
Como resposta, o STF e o Conselho Nacional de Justiça lançaram, em parceria com o Ministério da Justiça e Segurança Pública e com a colaboração de entidades da sociedade civil – entre elas o IBCCRIM –, o Plano Pena Justa. A iniciativa reúne mais de 300 metas a serem cumpridas até 2027, incluindo medidas de controle da superlotação, articulação com a Justiça do Trabalho e políticas educacionais para ampliar o acesso a oportunidades de estudo e trabalho no cárcere, além da exigência de condições mínimas de dignidade nas unidades prisionais.
Para o IBCCRIM, o Pena Justa inaugura um processo estrutural inédito no país, que requer ação conjunta de diferentes poderes da República e vigilância constante da sociedade civil. O Instituto criou neste ano o Observatório da Pena Justa e reafirma sua disposição de acompanhar a implementação do plano em âmbito nacional e estadual, contribuindo com análises críticas e propondo medidas concretas para a redução da população prisional e a efetivação de direitos.
Passados 33 anos do Carandiru, o IBCCRIM mantém vivo o compromisso de denunciar e enfrentar as violações no sistema de justiça criminal. Por meio de seus departamentos temáticos, publicações, pareceres e atividades acadêmicas, o Instituto seguirá atuando para que a memória do massacre não se perca, e para que o Brasil finalmente supere o ciclo de violência e autoritarismo que marcou sua história penal.